sexta-feira, 12 de abril de 2013

Temos estádios, mas ainda nos falta educação

O título não tem a intenção de ser ofensivo, apenas relata o que vi nesta semana ao assistir o jogo entre Grêmio e Fluminense na Arena do Grêmio em Porto Alegre. Acredito que o que relatarei servirá para todos os demais estádios que estão ficando prontos no Brasil. 

O estádio é lindo e imponente. Ao chegar na cidade, ainda no avião, ele já se destaca e chama a atenção dos passageiros, virou um cartão postal. Ao entrar no bairro onde está o estádio, o deslumbre é momentaneamente suspenso devido as casas humildes ao redor. Tamanho monumento parece não se enquadrar naquele cenário, mas acredito que com o tempo e o término das obras por parte do governo, as coisas irão melhorar, tanto para os torcedores quanto para os que ali residem.

Acesso
O jogo estava marcado para as 22 h, chegamos cedo, por volta das 19 h e uma hora antes dos portões serem abertos. Ao descer do táxi, minha primeira preocupação, por estar em uma cadeira de rodas, era com o caminho e os obstáculos de sempre: pedras, meio-fio, buracos... Porém, perto do que estou acostumado, quase não encontrei problemas. Tudo é muito bem sinalizado e sem dificuldade para um cadeirante ou qualquer pessoa com dificuldade de se locomover.

Uma reclamação constante dos torcedores, que tenho acompanhado pela imprensa e nas redes sociais, é do tratamento dos funcionáios da Arena Porto-Alegrense (empresa gerenciada em parceria pela OAS, construtora da Arena, e pelo Grêmio) com os torcedores. Falta de educação, truculência e tolerância zero é o que mais tenho lido nas queixas, resolvi checar. Ao chegar, logo nos dirigimos a um guarda para pedir informações sobre onde deveríamos acessar o estádio e mais uma vez não tivemos dificuldades, mas aqui vale uma ressalva: o estádio é lindo e muitos, como eu, vão para além de ver o jogo, apreciar e bater fotos da Arena. Porém, com os portões abertos apenas duas horas antes do jogo, os torcedores perdem tempo aguardando do lado de fora e o Grêmio perde dinheiro, pois uma quantidade enorme de torcedores deixa de gastar seu valioso salário no estádio.

Filas grandes se formaram fora do estádio.
Após acharmos nossa rampa de acesso, ficamos ao lado da entrada e na ponta da fila para exercemos a preferência. Aqui o primeiro "problema", o fiscal de apoio não permitiu a entrada de pessoas que estavam comigo, apenas a do meu acompanhante. Coloquei entre aspas justamente por entender que, apesar de não ser flexível e deixar os demais que estavam comigo entrarem, o fiscal nada fez além de exercer o recomendado e o correto que é permitir a entrada preferencial somente do deficiente e de seu acompanhante, os demais tiveram que voltar para a fila.

Dentro do estádio
Lembram do deslumbre que eu havia perdido ao me deparar com os arredores da Arena? Pois é, ele voltou por completo ao entrarmos no estádio. É simplesmente SENSACIONAL, jamais havia visto um estádio de futebol como aquele. Nunca fui a estádios na europa, mas acredito que a Arena não deixa nada a desejar. A organização, limpeza e o número de funcionários é digna de primeiro mundo e não bate com os relatos que eu havia lido (como foi a minha primeira vez, não posso comparar com os jogos anteriores, apenas relato que, neste jogo, foi assim).

Após entrar e parar de babar pela beleza da Arena e principalmente pela proximidade do gramado, um funcionário, ao nos ver perdidos, logo se prontificou para ajudar a localizar o lugar marcado no ingresso. É verdade que ele também demorou a encontrar, mas isso não durou nem cinco minutos, logo nos acomodamos com toda calma e tranquilidade possível, sem o menor problema. Banheiro, bares e demais acomodações, todas 100% acessíveis.

Espaço reservado para os deficientes.
Mansões para favelados
Creio que o maior problema dos novos estádios seja a falta de educação de seus frequentadores, sejam eles gremistas na Arena, colorados no Beira-Rio ou cariocas no Maracanã, a falta de educação é geral. Quando estive nos EUA, tive a chance de ir a estádios de futebol americano e de beisebol. Neles, o esquema de funcionários, regras e organização é muito parecido com o que encontrei na Arena do Grêmio. Lembro que nos EUA, ao nos encaminharmos aos lugares marcados, parávamos para ver o jogo de lugares que não eram os nossos e logo em seguida vinha um fiscal nos mandar ir ao lugar correto. Se alguém fizesse algo de errado como jogar objetos no campo, lixo no chão ou ficar em pé na cadeira, rapidamente era repreendido pelos fiscais. Porém, lá ninguém fazia nada de errado. Por quê? Por que é cultural, eles estão acostumados com aquela maneira de agir, estão acostumados a serem civilizados e a respeitar o próximo, eles sabem exatamente que o direito de um termina onde começa o direito do outro, ao contrário da grande maioria dos brasileiros.

Aqui, os estádios são como mansões luxuosas, mas habitadas por pessoas que jamais moraram em tal casa, que não sabem como utilizá-la da forma correta e se negam a seguir as recomendações. Querem fazer um churrasco no meio da sala de estar, lógico que vai dar merda não vai funcionar. O Brasil está recebendo obras de primeiro mundo, mas a nossa educação ainda é de terceiro mundo. Somente quando aprendermos a seguir as leis e regras é que as coisas vão começar a melhorar. Precisamos aprender a viver sem utilizar o famoso "jeitinho brasileiro".

Para tentar exemplificar, durante o jogo na Arena, percebi três confusões com os fiscais. A primeira delas foi quando torcedores estouraram uma bomba e acenderam sinalizadores no meio da torcida (vídeo abaixo), algo PROIBIDO. A segunda foi quando torcedores acendiam cigarros dentro do estádio, o que também é PROIBIDO e era lembrado a todo instante pelo sistema de som; e a terceira quando torcedores sentavam em lugares reservados para outras pessoas, o que obviamente, também é PROIBIDO.



Na foto abaixo é possível ver um dos fiscais que ficavam em frente as vagas destinadas a portadores de necessidades especiais. A todo instante torcedores tentavam entrar neste espaço para ficar em pé atrás e/ou ao lado dos cadeirantes ali posicionados e os fiscais eram obrigados a, respeitosamente, pedir que se retirassem dali. Faltando cerca de 10 minutos para acabar o jogo, os fiscais sumiram e os torcedores, mal educados, invadiram o local ficando em pé ao meu lado. A partir deste momento, eu fiquei sem poder assistir o jogo direito, pois os invasores atrapalhavam a minha visão do campo.

Espaço reservado para deficientes e fiscal garantindo que ninguém invada o local.
Além dos problemas citados, uma quarta confusão ocorreu e essa nem precisarei relatar que o motivo também era PROIBIDO, pois chega a ser absurda. As torcidas de Grêmio e Flu estavam separadas, mas um burro, idiota, ignorante... "valentão" da torcida do Fluminense quis aparecer e invadiu a área reservada aos gremistas. O resultado foi óbvio e você pode ver abaixo.


Não sei se perceberam, mas pra mim ficou nítido o motivo de todas as confusões, elas só aconteceram por que os torcedores fizeram algo que era PROIBIDO. Não me interessa se as regras são abusivas ou não, o que me interessa e devia interessar a todos os que ali estavam é que tais regras existem e devem ser obedecidas por todos.

Confesso que não acho que será fácil os torcedores brasileiros se adaptarem a tantas mudanças, a nossa cultura em estádios de futebol é diferente da europeia ou da norte-americana, infelizmente. O fato é que, talvez demore, mas eu torço muito para que essas regras e medidas drásticas continuem existindo, para quem sabe assim, em um futuro próximo e com uma melhor educação, nossos estádios continuem sendo como mansões e não regridam a favelas pela atitude de invasores mal educados.

"People too weak to follow their own dreams will always find a way to discourage yours"

3 comentários:

Anônimo disse...


Oi Fabio! Acho que nos cruzamos por lá, também sou cadeirante. Sobre a Arena: realmente, voltei pra casa pensando o quanto os torcedores podem prejudicar uma linda festa. Do meu lado, quatro homens discutiram feio com um repórter. Motivo: queriam meter o pau na Brigada Militar e o repórter, por ñ ter presenciado nada, ñ teve interesse na pauta, atitude correta em minha opinião. A estrutura da Arena me deixou de boca aberta, é muito lindo, limpo e organizado. Não tive problemas em me localizar, visto que os funcionários me orientaram corretamente e foram super prestativos. O que não gostei: as rampas da entrada me parecem inacabadas, pois possuem alguns desníveis que pra quem anda tá ok, mas para um cadeirante merece alerta ligado. Sobre os acompanhantes no espaço reservado: gostaria muito que no mínimo três amigos pudessem assistir o jogo comigo, mas acredito que a regra imposta deva ser respeitada em função do comportamento de certos (muitos!) torcedores. Abraços, Carlena.

Joel disse...

Concordo contigo, brasileiros acham que podem tudo e fazem tudo como querem, ótimo texto.
Abraços
Joel

Josué Marle disse...

Baita texto guri! Parabéns, escreve muito bem.